Durante minha trajetória dentro do Candomblé, encontrei as mais diversas pessoas, e, todas professavam fé nos Orixás. Mas posso garantir que muito poucas encontrei que realmente tivesse a tal fé professada.
Ocorre que, antigamente, uma pessoa fazia santo, para ser esposa ou esposo de Orixá. Tinha em mente que seu Orixá era nada mais nada menos, que uma religião e como tal, intercederia sim em sua vida, mas suas provações não deixariam de existir.
Não se fazia Santo com o intuito de enriquecer, de se tornar celebridade. Apenas se fazia Santo para se cumprir uma exigência daquele ser Divino, que cobrava a iniciação. Eram as pessoas; felizes com seu Orixá, não importando os problemas que tivessem em suas vidas, pois sabiam que vivemos em um mundo onde a maldade e a desigualdade imperam.
Não havia o tipo de pergunta: “onde está o santo?” “Foi para isso que dei comida ao Santo?”.
As pessoas eram felizes pelo simples fato de estarem comungando com sua fé, sabendo que dias melhores estavam por vir.
Hoje, coitado do Santo que não der um carro zero a seu filho, uma mansão para determinado cliente e assim por diante. Trocaram a fé pelo conforto material, o amor pelas divindades foi trocado pelo luxo e pela avareza.
Não sou muito velho no santo, fui iniciado em 1983 e muito aprendi no quesito de amor ao santo acima de tudo nessa Terra. Vi muitas pessoas realmente velhas no santo, professarem seu amor, sua dedicação aos seres que governam a natureza. Tive o privilegio de conviver com pessoas que não mais estão nesse mundo, mas, que deixaram sua marca de amor e submissão ao Orixá e às vontades de Deus.
O que vejo hoje, muito me entristece, pois vejo pessoas que se dizem com fé, blasfemarem aos quatro cantos do mundo contra os Orixás, quando algo não sai do jeito que desejam.
Já encontrei até mesmo pessoas que nunca tomaram sequer água de obi, mas por terem santo de alguém de sua família em casa, que ao passarem certas dificuldades, perguntou aos Santos:
“O que vocês estão fazendo aqui?”
Quanta pobreza de espírito! Quanta maldade no coração dessa pessoa! Pergunto-me: por que a sua religião, a qual frequentou tanto tempo, não deu moral em seu espírito nem a livrou de tanto sofrimento?
Simples, porque era somente sua religião e nada mais, além disso.
O fato de termos um Orixá, não significa que não mais iremos ter problemas em nossas vidas!
Ao contrario: sabe-se que toda pessoa que tem muita fé, sofre ainda mais que os demais, pois é testada a cada dia pelas forças negativas. Encontro sempre em meus caminhos, pessoas que professam outra religião, mas que sofrem muito e nem por isso culpam Deus por seu sofrimento.
Eu mesmo já passei por muitas coisas ruins nessa vida, de chegar ao ponto de ser roubado por um filho de santo, mas nem por isso culpei santo algum, nem mesmo o dele, pois penso que as coisas do mundo, tratamos no mundo.
Mas, as pessoas do Candomblé não podem passar por nada, que logo questionam: “onde está o santo”? Até mesmo pessoas de outras religiões, perguntam a mesma coisa. Quem disse que pelo fato de ser iniciada no Candomblé, uma pessoa deixaria de ter problemas ou de sofrer nesse mundo, sendo ele um planeta de expiações?
Passamos hoje e passaremos sempre por nossas provações, independente da religião que sigamos. Os Orixás existem para nos darem forças para seguir em nossa jornada e não como promessa de uma vida perfeita.
Ao invés de reclamarem do santo, por que não dizem: “ainda bem, porque senão fosse o santo poderia ter acontecido algo muito mais grave comigo”.
Viver para o santo é viver em uma eterna clausura, onde a vida material muito pouco existe para nós. Não cabe dentro do axé Orixá, reclamações, vinganças, lamúrias nem nada parecido.
Dentro do mundo dos Orixás cabe somente o amor e a submissão às vontades de Deus. Não nos é permitido questionarmos os mistérios de Deus nem de seus mensageiros. Se sofremos é tão somente porque estamos em um mundo onde a dor e a tristeza são partes ativas do viver.
Ao que me lembre de Orixá nunca nos prometeu, dia sem chuva, noite sem luar, vida sem tristeza, a única coisa que prometem, são fidelidade, amor e companheirismo por toda a vida!
Assim, se sua vida anda ruim, não se lamente, nem blasfeme contra os Orixás, mas faça algo para modificar seus dias e sua vida!
Tatetú N’Inkisi Odé Mutaloiá.