“Quem está de ronda é São Jorge,
meu pai me diga o que é, quem está de ronda é São Jorge, velando os filhos de
fé. Quem está de ronda é São Jorge, toda noite e todo dia, quem está de ronda é
São Jorge, Jesus, e a Virgem Maria”
Ponto muito antigo da Sagrada
Umbanda, e que me recordo dele no Terreiro de Caboclo Treme Terra no Bairro de
Caratoíra, Vitória E.S. Esse ponto nos traz a grandeza desse Santo guerreiro
que padeceu sob as ordens do Imperador Diocleciano em 23 de Abril de 303 na
Nicomédia, Ásia Menor. Mas, o que Diocleciano não poderia imaginar era que
estava construindo o culto mais aclamado em todo o mundo: o culto a São Jorge,
o Santo Guerreiro. E tantos são os povos que o cultuam, que não existe a mínima
chance de dizer que esse Santo não existiu.
Mas, quem é São Jorge e qual sua história
afinal?
Segundo pesquisas, Jorge teria
nascido na Capadócia, região central da Anatólia que hoje faz parte da Turquia.
Era filho de Militar e seu pai segundo as pesquisas teria morrido em batalha.
Após a morte de seu pai, Jorge ainda criança, mudou-se com sua mãe para a
Palestina e ali viveu em Lida Cidade de sua mãe, que segundo a Bíblia, foi
fundada por um membro da tribo judaica de Benjamim chamado Samed (1Cr 8:12). No
Novo Testamento, foi cenário da cura de um paralítico efetuada por Pedro (At 9:
32-35). Como sua mãe era abastada, Jorge foi criado com esmero, nada faltando
para a educação de um jovem de seu tempo. Mas, como era um jovem de
temperamento forte, se identificou com a carreira militar, afinal, era ele por
natureza um combatente, e tamanho foi empenho que não demorou a ser nomeado
Capitão do Exército Romano pelo Imperador. Nota-se que tudo isso se deu ainda
em sua juventude, tanto que pelos idos de seus vinte anos Jorge foi condecorado
com o título de Conde da Capadócia.
Tinha apenas 23 anos de idade
quando se deu o falecimento de sua mãe, então, foi residir na corte de
Diocleciano o Imperador de Roma, mais precisamente na Nicomédia e ali exercia a
função de Tribuno Militar.
Todos sabemos, baseados na
história, que Diocleciano, foi quem mais perseguiu os cristãos e pôs fim à vida
de muitos, inclusive de outros mártires do cristianismo. Este Imperador,
possuía um ódio mortal tanto pelos cristãos, como pelo próprio Cristo, mesmo
tendo sua vida antecedido em séculos a de Diocleciano, mas, esse via em Cristo
Jesus, uma ameaça a seu reinado bem como a seus deuses. E não media esforços
para perseguir e massacrar os cristãos e sua fé.
Tanto que em 302 publicou um
édito que mandava prender todo soldado romano cristão e que todos os outros
deveriam oferecer sacrifício aos deuses romanos. Cristão que era, Jorge foi ao
encontro do Imperador a fim de objetar essa ação, e para espanto de todos e
principalmente de seu Imperador, declarou-se perante aos que ali estavam, como
cristão. Porém Diocleciano não queria perder Jorge de suas fileiras e
prontamente começou a tentar de todas as formas fazer com que seu capitão,
tribuno e Conde, abandonasse sua fé, renegando ao Deus cristão e declarando
amor e culto aos deuses romanos.
Porém, Jorge não aceitou nada que
o Imperador lhe ofereceu como “pagamento” por sua renúncia, mesmo sendo terras,
dinheiro e escravos, e manteve-se fiel à sua fé, possuído de ódio, Diocleciano
mandou então que o torturassem para que ele através da dor, abandonasse a fé, e
Jorge foi torturado de todas as formas mais terríveis que puderam lançar mão. Mas,
depois de cada tortura, quando era levado de novo à frente do Imperador e esse
lhe perguntava se renegava a Jesus em prol dos deuses romanos, Jorge reafirmava
sua fé com mais ardor ainda. Seu martírio no entanto, foi ganhando notoriedade
e muitos romanos culminaram por tomar as dores daquele jovem, inclusive, contam
fatos históricos, que até mesmo a mulher de Diocleciano se comoveu com a forma
com a qual o bravo e valente soldado era torturado e ela então se converteu ao
cristianismo. Além disso, outras pessoas se comoveram com seu martírio, como os
mulçumanos, por exemplo.
Vendo Diocleciano que nada do que
fazia tinha o poder de persuasão com Jorge, culminou por mandar que fosse
degolado e o fato se deu em 23 de Abril de 303, na cidade de Nicomédia na Ásia
Menor.
Estudiosos dão conta de que um
dos primeiros lugares de devoção teria sido na Síria, onde inclusive existem
sepulturas que fomenta-se terem sido os primeiros locais de descanso final de
seus restos mortais, o que é confirmado pela Enciclopédia
Católica, onde podemos assim ler: “Las narrativas de los antiguos peregrinos,
Teodosio, Antonino, y Arculfo, desde los siglos sexto al octavo, todos hablan
de Lydda o Dospolis como el asiento de la veneración de San Jorge, y como el
lugar de descanso de sus restos (Geyer, “Itinera Hierosol.”,139, 176, 288)”. E seguindo
lemos assim: “La antigua fecha de las
devociones al santo es atestiguada por las inscripciones existentes en ruinas
de las iglesias en Síria, Mesopotamia, y Egipto y la iglesia de San Jorge en
Tesalónica es también considerada por algunas autoridades como perteneciente al
siglo cuarto.”
Como podemos observar, São Jorge tem seu
culto bem estruturado e arraigado em povos antigos, que viam n’ele a verdadeira
expressão da fé em Jesus Cristo e seus ensinamentos. Viam um jovem que mesmo
com pouca idade, sabia dar combate nos campos de batalha como sabia defender
sua fé com a mesma valentia.
Após sua morte, seus restos mortais foram
transferidos para Lida, antiga Dóspolis, local onde crescera com sua mãe. Mais
tarde o Imperador cristão Constantino, mandou erguer um suntuoso oratório
aberto a todos os fiéis fazendo assim, com que a devoção a Jorge, se espalhasse
por todo o Oriente.
Pelos idos do século V. haviam cinco
igrejas dedicadas a ele. Apenas no Egito, nos primeiros séculos após sua morte
foram construídas quatro igrejas e quarenta conventos e dedicados ao mártir
Jorge. Em alguns lugares como Armênia, Império Bizantino, Estreito de Bósforo e
na Grécia, São Jorge sempre foi inscrito como um dos maiores Santos do
catolicismo.
Dentro dos termos eclesiásticos, o dia de
São Jorge, 23 de Abril era mantido com um feriado menor. Quando em 1415, a Constituição
do Arcebispo Chicele, trouxe mais luz a esse dia e o transformou em uma das
maiores festas cristãs, e ainda ordenou que fosse observado como Dia de Natal.
Seu sincretismo com Ogum, deu-se ainda
com os escravos que aqui viviam, e por ser Ogum, caçador, agricultor e
guerreiro destemido e valente, esses escravos oriundos de vários locais da
África, viram no Santo Católico, uma figura similar a Ogum, que sempre venceu
as batalhas onde quer que estivesse. E com esse sincretismo, Ogum que sempre
fora cultuado como protetor das colheitas e caçador, juntamente com seu irmão
consanguíneo, Oxossi, passou a ser somente o guerreiro, cabendo ao segundo,
toda a consagração de caçador e agricultor.
Mas, o sincretismo tomou conta no Brasil,
pois que, eram os negros, proibidos de praticarem sua religião, que segundo a
Igreja de Roma, “era um culto a satanás”, e como todos que praticassem outra
filosofia que não a romana eram torturados e mortos, viram os negros, a única
saída possível: sincretizar seus Orixás com os Santos permitidos por Roma.
A forma que mais firmou esse sincretismo,
foi quando na Guerra do Paraguai, o Brasil entrou com seus soldados. Temos que
nos lembrar de que a grande maioria dos marinheiros daquela época eram negros,
e com isso, Ogum passou definitivamente a ser correspondido com São Jorge,
tanto que durante aquela Guerra, os Santos, Jorge e Antônio de Pádua, seus
correspondentes no Rio de Janeiro e Bahia, respectivamente, chegaram a ter
patentes de Oficial e receber soldo, isso tanto no Exército como na Marinha,
conforme nos relata a história, e ainda o ponto: “Ogum já jurou bandeira, nos
campos do Humaitá…”, é uma alusão à localidade de Humaitá, onde se travou a
batalha mais importante dessa guerra.
Com os escravos, apreendemos que Ogum
guerreia ferozmente contra seus inimigos, que destrói todas as forças que
tentam tirar seu reino e a paz de seu povo. Aprendemos ainda que é um Orixá
muito justo e que somente não teve seu reino destruído como pedira Nanã, pois
Orumilá via em Ogum um homem honrado, valente, que não mentia e respeitava seus
pais.
Com os europeus, aprendemos que Jorge era
valente, destemido, guerreiro martirizado em nome de sua fé. Então se formos analisar,
a correspondência entre eles é algo certo e inquestionável. Mesmo hoje com a
modernização e as leis que amparam nossa religião, o que fez com que o sincretismo
deixasse de existir praticamente, entre os adeptos de Ogum, São Jorge continua
mais fidedigno que nunca a seu título.
Nos seus pontos na Umbanda, temos
constantemente a exaltação dos campos de batalha, o que leva católicos e
evangélicos e dizerem que Ogum é demônio sim, pois que, veneramos a violência
dos campos de batalha. Mas isso é um erro incomensurável. Ao exaltarmos os
campos de batalha, exaltamos na verdade, as batalhas vencidas na guerra do
Paraguai e outras, sob a proteção de São Jorge/Ogum, e nos dias de hoje, exaltamos
a mesma ajuda mas na batalha do dia a dia, onde temos que vencer constantemente
pois vivermos em um mundo globalizado e com isso a concorrência ficou ainda
mais acirrada. É também à batalha travada pelos pequenos e médios empresários
que tentam sobreviver em um verdadeiro campo minado, onde o imperialismo da
grandes empresas massacram a quem ousar entrar em seu caminho.
Assim como São Jorge, Ogum é tão somente
nosso defensor e abre as portas para que possamos entrar, abre os caminhos para
que possamos passar.
FOTOS: