Praticamente todas as casas de
Candomblé, principalmente as de Angola, cultuam o “dia de todos os Santos”, o
que era feito também em algumas casas de outras nações mais antigas na Bahia, onde seus zeladores e zeladoras
faziam parte de alguma comunidade católica.
Neste dia, acendemos nossos
Orixás, colocamos água em suas quartinhas e batemos paó, pedindo a misericórdia
para nós e nossas vidas. Afinal, estamos nos aproximando do dia de finados, e
devemos respeitar os mortos, bem como, dar-lhes o culto necessário.
Mas, como surgiu esse dia de
todos os santos?
A enciclopédia católica nos
ensina que este dia, é na verdade uma festa em homenagem a todos os santos
sejam eles conhecidos ou desconhecidos. Seu início real, segundo historiadores,
vem do segundo século, onde cristãos tiveram a ideia de honrar todos os que
haviam sido martirizados em nome e honra de Jesus Cristo e de sua fé.
Como deduziam que eles estivessem
no Céu junto com Cristo, rezavam a eles pedindo que interagissem em suas vidas,
pedindo a Deus por eles, afastando todo o mal que por ventura pudessem
encontrar, afinal, eram dias difíceis, e a perseguição era ainda muito grande.
Suplicavam que seus mártires olhassem por eles, que os ajudassem a suplantar todas
as angústias, dores e sofrimentos que pudessem encontrar em seus caminhos, afinal
pregar os ensinamentos de Cristo, já tinha causado a morte de muitos
antecessores.
Porém, o Dia de Todos os Santos,
somente foi oficializado, passando a ter seu culto regular em 13 de Maio de 609
ou 610 D.C. quando o Papa Bonifácio IV dedicou o Templo Romano de Todos os
Deuses à Maria e a todos os mártires de sua Igreja. Segundo Markale, “os deuses
romanos cederam lugar aos santos da religião vitoriosa”. Isso porque, durante
as ditas “guerras santas” a igreja católica dizimou boa parte dos seguidores
das religiões que eles consideravam pagãs e como sabemos quem vence impõe até
mesmo seu credo.
Mas, a data de 1 de Novembro, foi
introduzida, quando o Papa Gregório III, dedicou uma capela em Roma a todos os
santos, e determinou que sua homenagem ocorresse neste dia. Não se tem uma
certeza na história do porque dessa decisão, alguns estudiosos, acreditam que
tenha sido devido a um feriado pagão que ainda era comum na Inglaterra. E como
lá foi introduzido esse culto a Todos os Santos a fim de acabar com o feriado
pagão, acreditam alguns historiadores que essa decisão foi a mola que
impulsionou o Papa a determinar esse dia comemorativo.
Mas, se o Dia de Todos os Santos
é de origem católica, por que no Candomblé guardamos o mesmo?
Ocorre que segundo nos ensina a
liturgia denominada Dia de Todos os Santos, essa data era na verdade uma cerimonia Celta,
na qual comemoravam a passagem de ano daquele povo. Marca o Samhain, o fim do
verão e o começo do inverno, ou seja: o ano novo Celta.
Para alguns
escritores, boa parte da tradição do Halloween, Dia de Todos os Santos, e do
dia dos fiéis defuntos, está associada ao Samhain. Os Celtas e demais povos
antigos, acreditavam que no Samhain, as almas dos mortos voltavam até suas
casas a fim de visitarem seus entes queridos e também vinham em busca de
alimentos e do calor das fogueiras a fim de espantarem o frio.
Para vários
autores, não existem provas de que o Samahin seja relacionado ao culto aos
mortos, segundo eles, essa crença somente se popularizou durante o século XIX.
Alguns relatos antigos atribuem ao Samahin, a época em que tribos conquistadas
pagavam tributos a seus conquistadores.
Segundo
relatos, durante toda a cristianização da Grã-Bretanha, o Samahin se mantinha
como festividade popular e ativa dentre os povos Celtas. Então, a igreja
britânica, a fim de desviar o foco da atenção comemorativa pagã, resolveu
introduzir uma comemoração cristã em seu calendário na mesma data da festividade
dos Celtas.
Para
os estudiosos, é possível que a atitude da igreja britânica, tenha sido a
grande precursora da popularização da festa de Todos os Santos. Era costume dos
irlandeses, reservar o primeiro dia de cada mês para as comemorações, e, como
1º de Novembro era justamente a festividade dos Celtas, a igreja viu o momento
oportuno de realizar o seu festejo nesse dia. Então, finalmente em 835 D.C. o
Papa Gregório IV declarou o dia primeiro de Novembro, como data universal do
Dia de Todos os Santos.
À
exemplo dos Celtas, os africanos também tinham suas datas comemorativas, e
claro que em seu calendário, estava o dia de louvar a Olorúm e seus Ministros,
seus antepassados. Ao fixarem sua religião no Brasil, introduziram várias datas
e eventos em seus ritos.
Com
o crescimento da Religião dos Orixás, alguns zeladores viram a oportunidade de
saudarem todos os Orixás conhecidos e também todos os que não eram de
conhecimento brasileiro, e passaram a fazer isso justamente no dia de todos os
santos.
É
importante que nós, dentro de nossas casas, mantenhamos a mesma cultura de
nossos ancestrais, que não maculemos suas festividades nem mesmo seus
preceitos, por mais que nos pareçam estranhos, pois estaremos assim, mantendo
nossas raízes e assim estaremos em paz com esses que nos precederam em nossa
fé.
Louvemos,
pois, nossos Orixás no Dia de Todos os Santos, acendamos nossas velas,
coloquemos água em suas quartinhas, pois com certeza, em nada isso nos
prejudicará, ao contrário, estaremos mostrando a nossos antepassados, que por
mais que o mundo evolua, suas crendices, seus rituais estão preservados e sua
memória mais viva em nossos corações.
Sérgio Silveira Tatetú N'Inkisi Odé Mutaloiá, Presidente do Conselho Religoso da UNESCAP.
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